"Você pode viver por toda uma vida e, ao final dela, saber mais sobre outras pessoas do que você sabe sobre si mesmo."

(Beryl Markham)

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

O Mito da Caverna

     Suponhamos uns homens numa habitação subterrânea em forma de caverna, com uma entrada aberta para a luz, que se estende a todo comprimento dessa gruta. Estão lá dentro desde a infância, algemados de pernas e pescoços, de tal maneira que só lhes é dado permanecer no mesmo lugar e olhar em frente; são incapazes de voltar a cabeça, por causa dos grilhões; serve-lhes de iluminação um fogo que se queima ao longe, numa elevação, por detrás deles; entre a fogueira e os prisioneiros há um caminho ascenddente, ao longo do qual se construiu um pequeno muro, do gênero dos tapumes que os homens dos "robertos" colocam diante do público, para mostrarem as suas habilidades por cima deles.
     (...)
     Veja também ao longo desse muro homens que transportam toda espécie de objetos, que o ultrapassam: estatuetas de homens e de animais, de pedras e de madeira, de toda espécie de lavor; como é natural, dos que os transportam, uns falam, outros seguem calados.
     (...) Pessoas nessas condições não pensavam que a realizade fosse senão a sombra dos objetos.
     (...) O que aconteceria se eles fossem soltos das cadeias e curados de sua ignorância, para ver se, regressados à sua natureza, as coisas se passavam desse modo. Logo que alguém soltasse um deles, e o forçasse a endireitar-se de repente, a voltar o pescoço, a andar e a olhar para a luz, ao fazer tudo isso, sentiria dor, e o deslumbramento impedi-lo-ia de fixar os objetos cujas sombras via outrora. Que julgas tu que ele diria, se alguém lhe afirmasse que até então ele só vira coisas vãs, ao passo que agora estava mais perto da realidade e via de verdade, voltado para objetos mais reais? E se ainda, monstrando-lhe cada um desses objetos que passavam, o forçassem com perguntas a dizer o que era? Não te parece que ele se veria com dificuldades e suporia que os objetos vistos outrora eram mais reais dos que os que agora lhe mostravam?
     (...) Precisava se habituar, julgo eu, se quisesse ver o mundo superior. Em primeiro lugar, olharia mais facilmente para as sombras, depois disso, para as imagens dos homens e dos outros objetos, refletidas na água e, por último, para os próprios objetos. A partir de então, seria capaz de contemplar o que há no céu, e o próprio céu, durante a noite, olhando para a luz das estrelas e da Lua, mais facilmente do que se fosse o Sol e seu brilho de dia.
     (...) Se um homem nessas condições descesse de novo para seu antigo posto, não teria os olhos cheios de trevas, ao regressar subitamente da luz do Sol?
     E se lhes fosse necessário julgar daquelas sombras em competição com os que tinham estado sempre prisioneiros, no período em que ainda estava ofuscado, antes de adaptar a vista - e o tempo de se habituar não seria pouco - acaso não causaria o riso, e não diriam dele que por ter subido ao mundo superior, estragara a vista, e que não valia a pena tentar a ascensão? E a quem tentasse soltá-los e conduzí-los até cima, se pudesse agarrá-lo e matá-lo, não o matariam?
 
Texto retirado do Livro BULLYING - O Sofrimento das vítimas e agressores, do autor Gabriel Chalita.
 
 
 

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